Por Marcelo Cardoso
Marcelo Cardoso explora o conceito de zonas de estiramento e como as organizações podem criar ambientes de desenvolvimento para impulsionar o crescimento individual e coletivo
Aqueles que me acompanham nesta coluna sabem o quanto sou um defensor fervoroso do desenvolvimento humano nas organizações. A razão mais evidente para isso, do ponto de vista das empresas e instituições, é que ao criar ambientes propícios para o desenvolvimento de pessoas – seja por meio de programas intensivos, seja pela própria natureza da cultura organizacional – cultivamos líderes cada vez mais maduros, “antifrágeis” e criativamente capazes de prosperar diante dos desafios de complexidade crescente.
No trabalho que realizamos com organizações de todos os tipos, tamanhos e setores, estamos cada vez mais convencidos de que o fator que mais limita a evolução da própria organização é o estágio de desenvolvimento de suas principais lideranças.
Não há qualquer chance de uma empresa avançar, pensando em cultura organizacional, além desses líderes decisores. E se as melhores pessoas da equipe vão além desses líderes em termos de desenvolvimento, elas dificilmente permanecem nesta companhia por muito tempo. Ou seja, as organizações limitadas por seus líderes perdem as melhores mentes que poderiam ajudá-las a enfrentar seus principais desafios.
Um aspecto que raramente é discutido é uma razão importante para os indivíduos buscarem o desenvolvimento. Como explicou Robert Kegan, um dos mais importantes teóricos do assunto, em uma recente entrevista: “o fator que mais contribui para o esgotamento (burnout) é estar por muito tempo num mesmo platô de desenvolvimento, sem experimentar os efeitos vitalizantes e renovadores do seu próprio crescimento, então indivíduos precisam continuar a amadurecer e se desenvolver”.
O desenvolvimento é a própria recompensa do processo. Experimentamos uma sensação revigorante de expansão interna. De repente, o espaço cognitivo que antes sentíamos uma sensação de estreitamento, de pressão ou limitação, se expande e encontramos um empolgante campo de novas possibilidades, conjunturas, arranjos criativos e críticos. Novos recursos e novos desafios a enfrentar.
Por essa razão, em ambientes limitadores, as pessoas se sentem frustradas e tolhidas de seus potenciais. Elas se desmotivam e dificilmente permanecem por muito tempo. E não adianta pressioná-las. Um exemplo claro é a desmotivação daquelas crianças brilhantes que estão em uma turma aquém do seu real estágio. Elas não se sentem desafiadas e mobilizadas a participar.
Zonas de estiramento: como as organizações podem promover o desenvolvimento?
Muitas organizações possuem uma agenda de desenvolvimento de pessoas, no entanto, o que frequentemente observamos são treinamentos tradicionais que acumulam conhecimento e competências horizontais. Esses cursos, muitas vezes, não auxiliam as pessoas a enfrentarem os desafios de maturidade que as impedem de lidar com contextos de complexidade e ainda geram mais sensação de esgotamento e excesso de demandas.
Isso leva ao surgimento de um falso dilema muito presente na gestão de pessoas: o tempo de trabalho versus o tempo de aprendizagem.
O desenvolvimento vertical, o tipo de aprendizagem sobre o qual tenho falado, promove o amadurecimento do estágio de consciência das pessoas. Em nosso trabalho, utilizamos o modelo de Lógicas de Ação de Bill Torbert.
O desenvolvimento vertical não compete com o tempo de trabalho, pois não gera sobrecarga. Pelo contrário, ele opera no tempo psíquico da pessoa e gera bem-estar (embora o desconforto possa fazer parte do processo) e motivação intrínseca.
Outro ponto é que o processo de desenvolvimento não é como uma corrida ─ ou um acúmulo linear de melhorias. Ao contrário, é um processo contínuo de desconstrução de premissas, crenças, vieses, histórias e narrativas de vida. Amadurecemos conforme nos desconstruímos e, assim, abrimos possibilidades internas para sustentar uma maior complexidade, colocando-nos a serviço com mais possibilidades do que antes poderíamos imaginar.
O desenvolvimento na fase adulta, ao contrário da fase infantil, não ocorre de forma tão espontânea e depende de um esforço consciente e intencional por parte dos indivíduos e das organizações. Portanto, quando uma organização deseja estrategicamente promover um ambiente de aprendizagem favorável ao desenvolvimento, a questão que se coloca é: que tipo de ambiente é mais adequado para isso?
O senso comum costuma sugerir que precisamos sair da nossa zona de conforto e nos desafiar. No entanto, essa ideia pode facilmente encobrir um ambiente e uma cultura de abuso, pressão excessiva e toxicidade que, em vez de promover o crescimento, levam à exaustão, desconfiança, desmotivação, rotatividade, isolamento e respostas defensivas que são o oposto da evolução.
Por outro lado, ambientes que são excessivamente condescendentes, polidos, permissivos e superprotetores podem criar uma falsa sensação de segurança psicológica e acolhimento no local de trabalho. Esses ambientes podem se tornar lugares onde qualquer tipo de comportamento é tolerado, resultando na perda de foco, intenção e motivação devido à falta de desafio. Gradualmente, as pessoas começam a se sentir desmotivadas e muitas vezes desconhecem a razão.
Robert Kegan menciona as “zonas de estiramento” (stretch zones), que são ambientes que promovem simultaneamente desafio e suporte para o desenvolvimento. Esses são espaços que empurram além da zona de conforto, mas ao mesmo tempo não esticam a corda além do que o indivíduo pode suportar. Em outras palavras, são ambientes que mantêm um equilíbrio dinâmico entre esses dois pólos.
Não existe uma fórmula mágica ou um modelo rígido que se aplique a todas as organizações e a todas as pessoas. Isso depende muito da cultura estabelecida, dos valores, do contexto geral e dos indivíduos envolvidos. No entanto, podemos definir indicadores para nos orientar quando o ambiente está demasiadamente desafiador ou, por outro lado, excessivamente condescendente, e adotar as intervenções adequadas.
As empresas podem e devem criar contextos de aprendizagem, com recursos de desafio e suporte, onde as pessoas possam mergulhar em si mesmas para criar espaço para evolução e desenvolvimento. Isso é benéfico e necessário para eles, para as equipes e para os interesses estratégicos da própria organização.
Link para o artigo original: https://thinkworklab.com/artigos/promovendo-o-desenvolvimento-pessoal-e-profissional-nas-organizacoes/
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