Por Marcelo Cardoso
O colunista Marcelo Cardoso escreve sobre o desafio das organizações que ainda tratam adultos como crianças.
A gestão nasceu da tentativa de reduzir incertezas e ganhar produtividade. Planejar, prever e controlar sempre foram formas de diminuir a distância entre o estado atual e o estado desejado.
Mas a vida organizacional é feita justamente desse intervalo. A verdadeira gestão é a arte de sustentar a tensão entre o que é e o que pode ser, sem apressar o desfecho, mas decidindo pelo que mantém o sistema em movimento.
É nesse espaço que a aprendizagem acontece.
O problema é que, para evitar o desconforto da incerteza, as organizações tentam domesticar a vida organizacional. Criam metas, indicadores e políticas para manter a aparência de previsibilidade.
O erro, que é a matéria prima da aprendizagem, passa a ser punido.
 O principal papel da gestão, que deveria ser regular a energia da tensão e liberar o aprendizado, é substituído pela tentativa de controlar a energia do desempenho.
Mas esse equívoco não pertence apenas às empresas. Ele começa muito antes, nos modelos de educação e na cultura que os sustenta.
 A maioria das crianças, mesmo nas melhores escolas, aprende cedo que será reconhecida e amada pela capacidade de acertar respostas.
 A curiosidade natural, esse impulso de explorar, errar e recomeçar, vai sendo substituída pela ansiedade de corresponder.
Na vida adulta, essa lógica se repete no trabalho: busca se aprovação e segurança onde poderia haver descoberta, exploração de direção e construção de significado.
 As organizações apenas reproduzem, em escala, essa pedagogia do medo disfarçada de meritocracia.
O resultado é uma infantilização sutil. Adultos tratados como crianças que só aprendem mediante prêmios e punições.
 Como lembra Donna Hicks, dignidade é reconhecer a humanidade do outro, e uma organização que não confia na capacidade das pessoas de aprender a partir da própria experiência retira delas essa dignidade.
A andragogia, o campo do aprendizado de adultos, mostra que o desenvolvimento real nasce de autonomia, propósito e reflexão compartilhada.
 Mas a maioria das empresas ainda insiste em ensinar.
 As áreas de educação corporativa, mesmo com boas intenções, reproduzem os modelos escolares que herdaram: cursos baseados em competências, catálogos de habilidades e trilhas lineares.
Quando o mundo exige cocriar futuros inéditos, seguimos oferecendo manuais sobre o passado.
 O desafio hoje não é aprender mais, é aprender a aprender, e mais importante ainda, aprender a desaprender.
O aprendizado genuíno não nasce do acerto, mas do encontro.
 Acontece no espaço aberto entre as pessoas, onde há confiança suficiente para discordar e vulnerabilidade para mudar de ideia.
É ali que o erro se transforma em fertilidade e o conflito em curiosidade.
Ambientes de segurança e coragem psicológica são fundamentais para que essa vulnerabilidade se torne prática coletiva.
 Gestores que sabem habitar esse campo, em vez de controla lo, criam contextos vivos de aprendizado, nos quais o sistema se reorganiza por dentro.
Quando gerimos com a premissa de liberar tensões, o erro deixa de ser falha e se torna informação, um sinal que orienta um processo de direção dinâmica, capaz de lidar com o que emerge.
Planos e metas passam a ser hipóteses vivas, ajustadas pela escuta do real.
 Controlar o futuro é impossível, ele sempre escapa dos planos porque está vivo.
A gestão madura não busca eliminar a tensão, mas escutá la.
O papel do líder não é eliminar o erro, e sim proteger o espaço onde ele possa gerar consciência.
 Porque aprender é, antes de tudo, um ato de dignidade, reconhecer se em processo, inacabado, vivo.

 
 
 

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